Política para Corajosos, Ciência Política, Direito Político & Relações Internacionais: Reflexões sobre o filósofo grego Sócrates

É possível repartir a história da Grécia antiga em dois períodos: antes e depois de Sócrates (469 - 399 a.C.). O primeiro período denominado Pré-Socrático; o segundo, período Socrático. No século V a.C., na Grécia antiga, ocorre uma grande revolução no pensamento grego. Os Deuses perdem a centralidade e o poder diante da compreensão da existência humana. Assim os homens passam a decidir com base em suas convicções e não através do poder divino. O homem passa a ser o centro do pensamento grego. A filosofia passa do Teocentrismo para o Antropocentrismo. (ROCHA, 2014)

"Existe um motivo histórico para que a civilização helênica dê essa guinada e faça reviravolta tão profunda em sua cultura e no pensar: no século V a.C., os gregos, vitoriosos em suas guerras e conquistadores da Ásia Menor, assistem, sob a direção de Péricles, à consolidação de seu poderio que se traduz de forma majestosa na estruturação da democracia ateniense, com maior estratificação de participação popular, a expansão das fronteiras gregas, acúmulo de riquezas, intensificação do comércio e abertura para o contato com outras civilizações. São estas condições que vão fazer surgir novas classes sociais e novos interesses na centralidade do discurso filosófico". (ROCHA, 2014)

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Grécia. Foto: Pixabay

Desse modo, a filosofia grega dá espaço ao saber científico mais pragmático. Tais conhecimentos se ligam assim aos anseios das novas elites e de militares vencedores, bem como comerciantes, que beneficiam de tais conquistas e contatos com outros povos. (ROCHA, 2014)

"Sócrates é um 'feroz' adversário dos sofistas [poder pela retórica]. A sua antipatia , no entanto, estava declaradamente circunscrita ao pensamento, ao conhecimento e à ânsia de construir uma Filosofia mais essencial, mais verdadeira. (ROCHA, 2014)

Com isso, para Sócrates, a essência do homem e a razão da questão existencial não é possível encontrar fundamento na "materialidade cotidiana" (com "interesses suspeitos e egoístas"). A procura da virtude, o bem mais elevado capaz de buscar a paz e a harmonia entre os homens, é vista como o embate entre o bem e o mal, porém num "plano estritamente espiritual". (ROCHA, 2014)

Daí a Alma é inserida no pensamento filosófico do Ocidente. Em oposição à retórica dos sofistas, Sócrates desenvolve o discurso dialético. "Por isso, a essência do conhecimento passa a ser entendida como a oposição e contraposição de ideias e axiomas". (ROCHA, 2014)

O pensador (Rodin). Foto: Pixabay

Finalmente, reflete o autor: "[u]nindo-se os conceitos de Alma e Dialética, necessariamente a verdade e a sabedoria deverão resultar no embate entre categorias especiais do espírito humano, e desta oposição deverá surgir o triunfo do bem sobre o mal, da verdade sobre a mentira, do conhecimento sobre a superficialidade, da essência sobre a aparência, do bem comum sobre os interesses casuísticos de grupos menores, enfim, o triunfo da Filosofia sobre a Retórica". (ROCHA, 2014)

Do ponto de vista jurídico: "De dois modos se pode alcançar o pensamento jurídico de Sócrates. Pelas suas ideias, em alguns dos diálogos propostos especialmente por Platão, e pela sua própria história pessoal de vida, na medida em que foi condenado pelos atenienses, defendeu-se por conta própria e, condenado, não fugiu nem comutou sua pena com multas. Por isso, sua execução também lança reflexões sobre sua própria perspectiva de filosofia do direito." (MASCARO, 2012)

Mascaro (2012) assim reflete sobre Sócrates: "Apoiado na razão, Sócrates empreendeu bem mais do que um pretenso elogio ao direito de Atenas, do qual na verdade foi voraz crítico: fez uma filosofia do direito". Daí: "Por muitos considerado a figura simbólica mais alta da filosofia".

No que se refere ao Julgamento de Sócrates, recorremos à obra de sua vida da Coleção: Os Pensadores. Pois bem...

"Diante do tribunal popular, Sócrates é acusado pelo poeta Meleto, pelo curtidor de peles, influente orador e político Ânito, e por Líncon, personagem de pouca importância. A acusação era grave: não reconhecer os deuses do Estado, introduzir novas divindades e corromper a juventude. O relato do julgamento feito por Platão (428-348 a.C.), a Apologia de Sócrates, é geralmente tido como bastante fiel aos fatos [...]". (SÓCRATES, 1999)

Platão, em seu relato, aponta que, em momento algum de sua defesa, Sócrates "apela para a bajulação ou tenta captar a misericórdia daqueles que o julgavam. Sua linguagem é serena - linguagem de quem fala em nome da própria consciência e não reconhece em si mesmo nenhuma culpa". (SÓCRATES, 1999)

"Mas Sócrates não faz concessões. Propor-se a cumprir qualquer pena, mesmo pagar uma multa, por menor que fosse, seria aceitar a culpa de que não o acusava a própria consciência". (SÓCRATES, 1999)

Finalmente, Sócrates não deixa saída para os juízes. "Ou a pena de morte, pedida por Meleto, ou ser alimentado no Pritaneu, enquanto fosse vivo, como herói ou benemérito da cidade. Impossível voltar atrás, desfazer a condenação, inocentar o acusado. Entre a morte e as impossíveis recompensas, os juízes ficaram sem alternativa real. Para não abrir mão de sua própria consciência, Sócrates optara pela morte. Que então morresse". (SÓCRATES, 1999)

Imagem: Pixabay

Curiosidades Literárias sobre Sócrates

Woody Allen, famoso roteirista e diretor de cinema americano, é o autor do livro "Que Loucura!" ("A loucura é relativa. Quem pode definir o que é verdadeiramente são ou insano?"). Nesta obra, há um conto emblemático: "Na pele de Sócrates". Sem muitos spoilers, cito apenas um trecho de aperitivo: "De todos os homens famosos deste mundo, o que eu mais gostaria de ter sido era Sócrates - o filosofo, claro. Não apenas porque ele foi um grande pensador, porque eu também sou capaz de observações profundas, embora as minhas se concentrem basicamente em bundas de aeromoças e preços de geladeiras. O que me fascina no mais sábio de todos os gregos é a sua incrível coragem diante da morte. Preferia dar sua vida para mostrar que tinha razão do que abandonar seus princípios, já viram coisa igual? [...]". (Recomendo vivamente a leitura!)

Referências